sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Não consegue inovar? A culpa é da gestão


Fonte: CIO – 8/04/2008

Esqueça o que você sabe sobre gestão, diz o guru de estratégia empresarial Gary Hamel. Nada disso vai ajudá-lo a vencer os desafios que sua empresa enfrenta. “Estamos vivendo em um mundo onde é a inovação que gera riqueza”, afirma Hamel, fundador da consultoria Strategos e professor visitante da London Business School.

Por mais de 20 anos, Hamel estudou o que as empresas precisam fazer para competir. Com C.K. Prahalad, introduziu o conceito de competências essenciais (core competences), como o único conhecimento que uma empresa possui que proporciona vantagem competitiva. Em 2000, o livro Liderando a Revolução exortou os leitores a aderir a mudanças – como fizeram as empresas pontocom – e reinventar seus modelos de negócio.

Em seu novo livro, O Futuro da Administração, Hamel argumenta que os princípios e as práticas utilizados para gerir a maioria das empresas foram inventados para resolver um problema – “como ser mais eficiente – que as empresas atuais têm dominado amplamente. “O pré-requisito mais crítico para alcançar níveis mais elevados de eficiência é a conformidade em relação a políticas, padrões, diretrizes e protocolos de qualidade, e ainda assim, obviamente, o pré-requisito mais fundamental para a inovação é a diversidade de pensamento e de ação.”

Hamel sugere reformular cada conceito de gestão, desde o modo como os empregados utilizam seu tempo até o modo como os fundos são alocados aos projetos para que os gestores possam inspirar os funcionários, identificar as idéias empresariais mais promissoras e canalizar os recursos para executá-las. Os departamentos de TI irão desempenhar um papel crítico de duas maneiras: em primeiro lugar, ao construir sistemas que as empresas utilizarão internamente para facilitar a inovação e, em segundo lugar, ao identificar de que forma as empresas podem usar novas tecnologias para desbancar modelos de negócio estabelecidos e fornecer novos produtos e serviços. Hamel conversou recentemente com a editora executiva da CIO norte-americana, Elana Varon, sobre o que os líderes de TI precisam fazer diferente.

CIO: As pessoas sempre reclamaram que a gestão freia a inovação. O que levou você a decidir que elas tinham razão?

Gary Hamel: Em parte, foi ter passado os últimos 20 anos ajudando empresas a inovar. O trabalho que a Strategos fez ao longo dos anos com empresas como Shell, Nokia e outras gerou bilhões de dólares em valor de mercado. Mas, tão logo você virava as costas, as organizações retornavam ao modelo antigo. Percebi que estava na hora de voltar às bases genéticas da gestão e das grandes organizações e entender como tornar as empresas sistematicamente mais inovadoras do que têm sido nos últimos cem anos.

CIO: Acha que existe diferença entre as empresas antigas e as novas? Exemplos apresentados no seu livro, como a Whole Foods Market e o Google, empregaram modelos de gestão não convencionais desde o início.

Gary Hamel: Sem dúvida é mais fácil construir um modelo de gestão mais favorável à inovação se você estiver começando com uma folha em branco. Dito isto, porém, a maior parte das pessoas que montam novas empresas vêm de grandes empresas. Então você encontra este DNA de gestão da era industrial em muitas empresas jovens. Um exercício que costumo fazer com as pessoas é supor que elas querem criar uma empresa inteiramente nova. Quão radicalmente elas mudariam o modo como a empresa é organizada ou gerida? A maioria das pessoas não consegue pensar em uma alternativa muito radical.

CIO: O que você quer dizer quando declara que a internet é a melhor metáfora para a gestão no século 21?

Gary Hamel: A gestão tem a ver com duas coisas. Uma delas trata de ampliar as capacidades humanas para criar as condições que inspiram as pessoas e incentivá-las a dar o melhor de si. A segunda dimensão está ligada a agregar capacidades humanas para que as pessoas possam fazer coletivamente o que não poderiam fazer individualmente. Por exemplo, fabricar um Boeing 787.

A internet está fazendo exatamente aquilo que se presume que a gerência deve fazer. Ela está ampliando e agregando capacidades humanas. Está democratizando as ferramentas de criatividade, desde câmeras digitais e blogs à capacidade de fazer mash-ups. A internet também é surpreendentemente boa em agregar capacidades humanas. Linux é o software com evolução mais rápida que os seres humanos já criaram.

Os três grandes desafios das empresas na próxima geração serão: adaptabilidade (como construir coisas que podem transformar-se); inovação (como mobilizar a imaginação de cada indivíduo na organização), e engajamento (como criar organizações tão envolventes emocional e intelectualmente que as pessoas queiram incorporar seus recursos ao trabalho. Qual é a coisa mais adaptável, inovadora e envolvente do planeta? A internet.

CIO: Os líderes de TI almejam ser facilitadores da inovação empresarial. Em que os departamentos de TI precisam mudar para que isso aconteça?

Gary Hamel: Para começar, pense na visão profunda sobre clientes, tecnologia e concorrentes que as pessoas precisam ter para serem inovadoras. Na maior parte das empresas, esta visão está muita restrita a especializações funcionais. Em segundo lugar, você tem de ser capaz de fazer experiências, testar coisas novas. A terceira coisa que você precisa para inovar é de recursos – e hoje a maioria das empresas é gerida com tanta rigidez que parece que cada dólar e cada hora de esforço humano já estão dedicados a algum projeto de missão crítica.

Na Whirlpool, temos nos empenhado em ajudar a criar um sistema de inovação capacitado por TI em que cada funcionário tem acesso a esse conhecimento profundo e em que é mais fácil para o funcionário propor suas idéias. Não é nenhuma ciência espacial. Apenas requer um novo conjunto de prioridades para o pessoal de TI.

Uma das perguntas que você tem de fazer é: em que medida nossos sistemas de TI nos tornam mais – ou menos – adaptáveis como empresa? Quando estou inovando nas empresas e queremos experimentar algo novo, o maior obstáculo, quase sempre, é a TI. Antes de tudo, eles vão dizer que estão tão sobrecarregados que não podem atender à solicitação nos próximos seis meses. Em segundo lugar, eles são tão movidos por questões de segurança e controle que, se você quiser tocar no sistema de TI, vai precisar da mão de Deus. Quando estamos ajudando as empresas a inovar, o que quer que façamos com TI, quase sempre fazemos em torno dos sistemas existentes, mas é lento demais, de cima para baixo demais e centrado no controle demais para ser útil.

CIO: Você diz que a inovação operacional raramente proporciona vantagem decisiva no longo prazo, mas é esta área que os CIOs, normalmente, enfocam.

Gary Hamel: Uma das coisas que abordo no livro é a hierarquia da inovação. Na base está a inovação operacional, os tipos de coisas que as empresas fazem para serem mais enxutas ou mais rápidas ou fornecer serviço ao cliente 24/7. Um nível acima disso está a inovação de produto, que disponibiliza a próxima televisão com tela plana fantástica. No nível seguinte você tem a inovação do modelo de negócio. A Dell, em uma certa época, foi inovadora em modelo de negócio. Em um nível mais acima está o que chamo de inovação arquitetural. É quando toda a indústria passa a pensar de maneira diferente – exatamente o que a Apple fez com iTunes, levando todas as gravadoras a aceitarem um novo sistema de gestão de direitos digitais.

No topo você tem a inovação da gestão. Toda a minha pesquisa sugere que foi a inovação da gestão que criou a fonte mais duradoura de vantagem competitiva. Mas a distribuição do esforço de TI está em proporção inversa ao potencial de criação de valor. A maior parte está na base e quase nada no topo. Se eu fosse um CEO, a primeira pergunta que faria em cada reunião de budget e em cada reunião de revisão com meu CIO seria: que percentual de todo o nosso budget e tempo é alocado para projetos que nos permitirão fazer algo único na nossa indústria?

Portanto, muitas empresas agora estão rodando as mesmas plataformas de software, seja Oracle ou SAP ou qualquer outra. Nós nos apoiamos cada vez mais no mesmo punhado de empresas de serviços de TI. Há uma série de coisas que o pessoal de TI precisa fazer para se manter na “corrida armamentista” de TI, mas, no final, a única coisa que realmente fará a diferença será usar TI de uma maneira exclusiva para fazer coisas exclusivas, sem comparativo. Se você perguntar a um CIO mediano qual porcentagem do seu budget total é dedicado a coisas que são exclusivas de sua indústria, acredito que provavelmente será um número realmente pequeno.

CIO: Qual deveria ser o número?
Gary Hamel: Dada a dimensão dos budgets de TI, acho que deveria ser algo entre 30% e 50%. E, em qualquer setor onde acharmos que não podemos criar vantagem competitiva, que outros o façam.

CIO: Os líderes de TI aprendem que a chave do sucesso está em colaborar com os gestores de negócio que vão patrocinar seus projetos. Mas você diz que “as pessoas com as idéias mais ousadas e úteis…provavelmente não são aquelas que estão gerindo estes processos atualmente”. Isso soa uma grande desconexão.

Gary Hamel: É uma desconexão. Se sou uma pessoa de TI e quero aumentar meu valor agregado na organização, uma maneira de fazer isso é ser responsivo e resolver os problemas da vice-presidência. Mas se esta é a minha visão de como eu estou agregando valor, então a minha capacidade de agregar valor é limitada pela imaginação destas pessoas.

Como CIO, você precisa trazer idéias para o grupo. Você tem de ser mais do que simplesmente responsivo. Você tem de estar lá com suas idéias, com seu ponto de vista, com oportunidades que estes líderes de negócio jamais imaginariam. Se você é um CIO, você precisa dedicar bastante tempo à web porque é onde a inovação está ocorrendo. E você precisa passar muito tempo com pessoas abaixo de 25 anos de idade.

CIO: Quais habilidades os gestores de tecnologia precisam ter para serem inovadores?

Gary Hamel: Não creio que você possa melhorar o desempenho da inovação a menos que entenda de onde ela vem. Número um, a inovação vem de desafiar dogmas da indústria. Você pode ensinar a si mesmo e aos outros como ser contestatório. Há dez anos, cada CEO no setor da aviação teria dito que a única maneira de competir era ter um sistema de rotas do tipo “hub and spokes”, até a Southwest e a JetBlue mudarem estas regras.

Número dois, é preciso entender os primeiros sinais de alerta de grandes mudanças na demografia, na tecnologia, na regulamentação ou qualquer coisa em que a maioria das empresas simplesmente não está prestando atenção. No livro, falo da Whole Foods. Se você observar as tendências sobre as quais eles construíram seu modelo de negócio – pessoas cada vez mais preocupadas com o que estão comendo, com a integridade da cadeia alimentar, com o impacto de herbicidas e pesticidas sobre o ambiente – são coisas que emergiram ao longo dos últimos 25 anos. Mas os supermercados tradicionais não estavam prestando atenção.

O terceiro tipo de competência pessoal de que você precisa para inovar é uma profunda empatia com as necessidades ocultas ou pouco claras dos seus clientes. Quando você compreende as frustrações que está provocando neles, começa a entender que há algo que poderia fazer diferente.

A última competência de que você precisa hoje, como inovador, é não pensar na sua empresa em termos do que ela produz. Você tem de pensar na sua empresa em termos do que ela possui e conhece, ou seja, seus ativos estratégicos. Então você pode perguntar: OK, o que mais poderíamos fazer com eles? As empresas param de inovar quando se tornam reféns de uma definição muito limitada de quem elas são.

Os CIOs precisam ser as pessoas mais criativas em suas organizações e, portanto, precisam ter estas habilidades.

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