quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Escravos da Urgência

Escravos da Urgência

Enquanto você executa as atividades rotineiras do trabalho, o telefone toca. De repente, o chefe passa na sua mesa e pede, para daqui a cinco minutos, aquele relatório com entrega prevista antes apenas para semana que vem. Tentando dar conta do pedido, você abre sua empanturrada caixa de e-mails para pegar algumas informações e vê uma nova mensagem brotar na tela. É a convocação para uma reunião de última hora com a equipe. E a pilha de tarefas pendentes se acumula. Se você já se viu em pelo menos uma dessas situações, é muito provável que tenha se perguntado como fazer tantas coisas em tão pouco tempo.

Para o especialista em gestão do tempo e produtividade Christian Barbosa, a resposta está diretamente ligada à organização pessoal. “A falta de objetivos claros, planejamento e de dizer ‘não’ levam o ambiente corporativo a uma urgência constante. Tudo é para ontem, e não sobra tempo para as pessoas se dedicarem às atividades importantes, que trazem retorno pessoal e profissional”, explica.

Antes de se organizar, porém, é preciso primeiro identificar o modo como seu tempo é gasto no dia-a-dia. Para ajudar na tarefa, Barbosa elaborou uma teoria de sucesso que ficou conhecida como tríade do tempo. Segundo ele, nossas atividades podem ser classificadas de três formas: importantes, urgentes e circunstanciais.

O princípio é fácil de entender. Importante é tudo aquilo que tem tempo para ser feito. São ocupações que trazem sensação de realização, prazer e bem-estar, ou seja, qualidade de vida. A decisão do que entra nesse grupo é muito pessoal e pode incluir desde a execução de metas profissionais até relacionamentos pessoais e lazer. Já o urgente são tarefas realizadas com pressa, porque o tempo é curto ou já estourou. Trazem muito estresse, pressão ou preocupação. Entre os exemplos típicos, estão acidentes, relatórios de última hora, problemas imprevistos com clientes, esquecimentos e reuniões emergenciais. A diferença do conceito de tempo da tríade para outros métodos de classificação é que não existe importante e urgente ao mesmo tempo. “Se você precisa ir ao cardiologista dentro de 15 dias para um check-up, isso é importante, mas se estiver enfartando nesse momento, a consulta passa a ser algo urgente”, exemplifica Barbosa.

Finalmente, o circunstancial inclui aquelas atividades que consomem tempo à toa. Não passam de afazeres desnecessários e que não trazem resultado algum para a vida, como ir obrigado a festas apenas para ser sociável, limpar caixa de e-mails cheia de spams (mensagem eletrônica não-solicitada enviada em massa) ou levar meia hora num cafezinho que normalmente duraria cinco minutos.

Com essas três esferas de divisão do tempo, a tríade serve como um indicador de produtividade pessoal. Apesar de não existir uma fórmula única, as experiências com a ferramenta mostram que o segredo para fazer o tempo render mais está em aumentar a quantidade de ocupações importantes e reduzir ao máximo o que faz parte das outras duas categorias, já que é impossível eliminá-las completamente. “Pessoas extremamente eficazes têm nível de importante entre 55% a 70%, urgente de 15% a 25% e circunstancial abaixo de 5%”, diz o especialista. Barbosa explica também que a flexibilidade dessa composição ocorre, porque cada pessoa tem conceitos particulares sobre o que é qualidade de vida. Para saber como é a sua tríade, clique aqui.

Uma vez identificada a composição de sua tríade, o próximo passo para sair da correria é aumentar a esfera de atividades importantes por meio de organização pessoal. Isso pode ser feito com o simples uso de uma agenda, que pode ser tanto um caderninho de bolso até um programa de computador. “Há pessoas que são mais high-tech, outras, tradicionais, e tem gente ainda que é a mistura dos dois estilos”, diz Barbosa. Independentemente de sua preferência, é indispensável escolher um tipo de ferramenta que melhor saiba usar. A única ressalva é quanto a fazer gestão de tempo por memória. “Muita gente pensa no que precisa fazer durante o dia e depois vai executando seus afazeres. Isso não funciona. É preciso descarregar as ansiedades e preocupações em algo”, afirma.

Além disso, duas características são necessárias para uma boa ferramenta: unidade e distribuição. Em outras palavras, deve-se usar apenas um instrumento de organização, mas, por outro lado, mantê-lo disponível para onde quer que o usuário vá. No caso de cadernos, isso é fácil, mas se a pessoa utiliza um gerenciador de e-mails como o Microsoft Outlook como agenda em casa, precisa tornar essas informações acessíveis em qualquer lugar por meio de outras ferramentas como smartphone e internet.

Agenda escolhida, agora está na hora de preenchê-la. A seqüência e a duração das tarefas devem levar em conta o ciclo natural de produtividade de cada pessoa, que é o ritmo de funcionamento do organismo, composto por momentos de alto e baixo desempenhos durante o dia. Há, por exemplo, pessoas que se sentem mais produtivas de manhã, outras, à tarde, ainda outras, à noite. Assim, períodos de alto desempenho precisam ser usados para execução de tarefas mais complexas, ao passo que os de menor rendimento devem ser reservados para atividades mais simples e rotineiras. Com isso, evita-se a procrastinação, comportamento que gera estresse futuro. Afinal, o importante negligenciado hoje será o urgente de amanhã, segundo o idealizador da tríade do tempo.

O ambiente de trabalho também pode exercer influência direta na produtividade. Um local onde há pouca conversa paralela e interrupções desordenadas propicia maior concentração. Segundo a Universidade de Yale, Estados Unidos, um indivíduo leva até 11 minutos para retomar o foco de uma atividade que interrompeu por conta de outra. Nessa questão, o grande desafio é evitar que as tecnologias cada vez mais disponíveis em toda parte se tornem uma fonte de distração. Entre esses grandes vilões do tempo, estão telefones, aparelhos celulares, internet, e-mails e programas de bate-papo.

Uma pesquisa realizada em 2005 pela equipe de Christian Barbosa com quase mil diretores e pesquisadores de Tecnologia da Informação revelou que 30% dos entrevistados passavam de uma a duas horas lendo e enviando e-mails – muitas vezes, eliminando spams –, e 22% gastavam mais de três horas navegando na internet para visitar especialmente websites técnicos e noticiários. Noventa e dois por cento dos profissionais faziam isso em horário comercial (veja o quadro “Como usar bem seu e-mail”).

Reuniões improdutivas e mal conduzidas também são um grande problema. “O mundo corporativo criou péssimos hábitos. Não há cumprimento de horários, as pessoas são chamadas de última hora e muitas vezes desconhecem o real propósito da reunião”, diz Barbosa. O especialista explica, porém, que isso é algo fácil de resolver com a adoção de algumas medidas. A primeira delas é expor claramente o objetivo da reunião para a equipe e listar por tópicos os assuntos que serão discutidos. Os encontros também devem ser breves – nunca ultrapassar duas horas –, e usados para estabelecer tarefas específicas e com data de conclusão para cada presente. Além disso, o ideal é que seus participantes sejam avisados com pelo menos dois dias de antecedência para que tenham tempo de se planejar para o encontro.

O uso equilibrado do tempo muitas vezes requer apenas colaboração da equipe como um todo. “Faça uma reunião toda sexta-feira de planejamento e pergunte: ‘Pessoal, o que na próxima semana pode gerar urgências para nós?’. Discuta isso entre a equipe e tente criar estratégias para reduzir o volume de urgências do dia-a-dia”, aconselha Barbosa.

Se focar em prioridades no dia-a-dia é uma grande proeza para funcionários, quem dirá para líderes que precisam administrar negócio próprio. Dividido em tantos afazeres, esse tipo de profissional é um forte candidato a se perder nas coisas pequenas da rotina e deixar de lado o que realmente é importante para a empresa, como o planejamento, a estratégia, a criação de metas, o plano de negócios e o desenvolvimento de parceiros. “Isso é muito comum entre empreendedores”, relata Barbosa, que também atua como instrutor do Empretec, seminário oferecido pelo Sebrae para o desenvolvimento de empreendedores no país. “É como se o dono de uma padaria quisesse fazer o pão porque é um excelente padeiro, em vez de se concentrar em como melhorar a produtividade do seu negócio. Se ele fizer isso, a empresa só conseguirá crescer até onde ele puder abraçá-la. Mas como seu tempo é limitado, logo a empresa também o será”, exemplifica. Por isso, delegar tarefas é fundamental.

Métodos de gestão de tempo como planejamento e organização são muito úteis, mas segundo Barbosa não há técnica eficiente o bastante que substitua o passo inicial para qualquer aumento na produtividade: a conscientização. “A pessoa que acha estar sempre certa não consegue fazer mudanças”, diz. O especialista salienta que estar determinado a melhorar comportamentos é um pré-requisito básico para qualquer profissional moderno, uma vez que o espírito de urgência é bastante valorizado no ambiente corporativo atual. Conforme explica, é muito comum a presença de chefes que seguram tarefas em vez de repassá-las logo à equipe exatamente para criar urgências na rotina. Isso produz uma ilusão de eficiência, capacidade e segurança. “A pessoa se sente um super-herói, mas, na verdade, prejudica a equipe, fica depois do expediente, leva trabalho para casa, se afasta das pessoas importantes na sua vida e fica doente.”

Idealizador da teoria da tríade do tempo e criador hoje da empresa que leva o mesmo nome, o especialista em produtividade Christian Barbosa já esteve nessa situação antes mesmo de imaginar o que era gestão do tempo. O jovem que aos 14 anos já tinha seu próprio negócio, aos 18 desempenhava função de liderança na Blue Eagle, empresa de tecnologia que passava por grande expansão na época. “Eu trabalhava de 16 a 18 horas por dia e fiquei muito doente. Adquiri uma gastrite, que mais tarde se tornou uma úlcera e depois um tumor”, relata. Assustado com o caso inédito para a idade do paciente, o médico recomendou que o rapaz fizesse um curso de Gestão de Tempo. Desde então, Barbosa se interessou pelo assunto, fez especializações e decidiu elaborar sua própria teoria atualizando o método de divisão matricial do tempo elaborado pelo ex-presidente norte-americano Dwight Eisenhower. Em 2004, lançou suas idéias no formato de um livro, A tríade do tempo: a evolução da produtividade pessoal (Editora Campos), que fez grande sucesso.

Hoje, a Tríade do Tempo é uma empresa que presta consultoria, treinamento, e oferece produtos para gestão do tempo e produtividade. Desenvolveu softwares de organização pessoal que centralizam todos os dados, informações, compromissos do usuário em uma só ferramenta, disponibilizando-os na rede para permitir acesso em outros lugares.

Um desses programas é o Neotriad (www.neotriad.com.br), que também faz classificação automática de atividades inseridas na ferramenta e alimenta o banco de pesquisas da Tríade do Tempo, atualmente com 2 milhões de atividades gerenciadas por meio do sistema. O Neotriad é usado como complemento das consultorias realizadas pela empresa, já que fornece uma rica quantidade de dados. “Chegamos ao nível de precisar qual é o pior dia de produtividade do funcionário xis para que seu supervisor delegue mais tarefas a ele exatamente nos seus picos de rendimento”, explica Barbosa. “Também podemos dizer se um profissional se dá melhor com tarefas de longa ou curta duração a fim de adaptar a forma de execução da atividade para seu perfil.”

Mais do que produtividade, Barbosa acredita que seus produtos e teoria ajudam os profissionais a ganharem mais qualidade de vida. “A vida passa rápido demais para quem vive de urgências e circunstâncias, e não de importâncias, coisas que realmente nos realizam.”

Coloque a vida em dia

Se você já tem uma agenda extrapolada de atividades e com mais urgências do que tempo para realizá-las, veja as dicas de como colocar a casa em ordem

1 – Qual o tamanho do estrago?
A primeira providência para resolver seu caos é listar todas as atividades pendentes, verificar reuniões, e-mails e tarefas inacabadas. Ao lado de cada atividade, coloque a duração prevista (em minutos ou horas) para executá-las.

2 – Classifique suas atividades
Como tudo está pendente mesmo, boa parte dessas tarefas não são verdadeiras urgências. Uma parte pode aguardar para ser resolvida, outras podem até ser canceladas ou delegadas. Ao lado da duração das tarefas, classifique os itens como importantes, circunstanciais ou urgentes, respectivamente.

3 – Priorize e planeje o que deve ser feito
O próximo passo é priorizar as urgências. Coloque uma ordem numérica e seqüencial das urgências que devem ser resolvidas primeiramente (priorize as coisas com menor duração, que são mais rápidas e fáceis de serem resolvidas). Depois, continue sua ordenação com as atividades importantes e, por último, as circunstanciais.

Depois, coloque suas prioridades no calendário da próxima semana, seguindo a ordem dos itens ao longo dos dias. Neste período, o ideal é minimizar ou evitar períodos de reuniões. Esteja pronto para dizer “não” para qualquer atividade circunstancial que aparecer. Priorize para cada dia apenas aquilo que será feito. Não coloque coisas demais, pois este não é o momento de gerar mais atrasos. Seja bem realista com você mesmo.

4 – Peça ajuda e negocie
Você está em estado de calamidade pública, e não é a hora para querer ser um herói solitário. Converse com a sua equipe ou com seu chefe, e mostre seu plano de ação para resolver as pendências. Peça a colaboração para evitar ser interrompido, ajuda para as novas atividades e o bom senso no uso de e-mails. Veja se algo pode ser delegado e passe para a equipe.

5 – Compromisso com você mesmo
Finalmente, para sair do sufoco, é necessário estar bastante comprometido com você mesmo. Nessa semana, provavelmente precisará trabalhar um pouco mais, cancelar atividades pessoais e ter um foco mais ativo. Lembre-se de que momentos assim devem ser raros. Se você está entrando nesse caos constantemente, algo pode estar errado com a forma como você tem planejado sua vida.





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